Capítulo - 3 -
A temporada no Hotel Kadri se prolongou e os quatro continuaram se vendo todas as noites no piano-bar quase vazio. Na medida em que se tornaram mais íntimos, Mireille deixou os resquícios de pudor de lado e passou a contar intimidades, como o fato de ter feito plástica nos seios e no nariz, algo incomum no Líbano à época.
Também descrevia viagens fascinantes por vários países da Europa e contava detalhes de todos os seus relacionamentos amorosos. Aos poucos, foi se soltando e apreciando verdadeiramente a companhia.
Certa noite, depois do costumeiro uísque no hotel, Ibrahim convidou os acompanhantes para ir a uma boate. Chegando lá, demonstrou sua intimidade com um ritmo que estava ganhando fama mundo afora, o samba brasileiro. Mireille ficou bem impressionada com aquela inusitada habilidade, adquirida no período da adolescência em que Ibrahim morou no Brasil, na casa da avó materna, quando teve a oportunidade de conhecer os Maloufs imigrantes e a forma pela qual representavam a cultura libanesa na América do Sul.
Tudo seguia bem até que, em Beirute, a mãe de Ibrahim, Adibe, ouviu falar que ele estava se encontrando com a tal Mireille no Hotel Kadri – e ficou transtornada. Como assim? Logo com a filha do armênio, divorciada, aquela menina que só fazia escândalos no hotel, que colocava salto alto, batom vermelho e usava shorts minúsculos? Por que Ibrahim estava dando trela para uma desclassificada como aquela, se era noivo de uma das moças mais cobiçadas de todo o Oriente Médio?
Sim, é preciso esclarecer esse ponto, embora Ibrahim curiosamente tivesse esquecido de contá-lo a Mireille nos primeiros encontros do piano-bar. De fato ele era noivo de uma mulher muito bela, egípcia, irmã justamente do ator Omar Sharif, que no ano seguinte ficaria famoso no mundo inteiro interpretando Lawrence da Arábia no cinema (e que, inusitadamente, também se tornaria campeão mundial de bridge, comprovando sua origem aristocrática).
Quando finalmente soube do noivado de Ibrahim, Mireille lembrou-se que, algumas semanas antes, estava no melhor cabeleireiro do Cairo e tinha ao seu lado uma mulher deslumbrante, de olhos amendoados e cabelos negros, que mostrava à manicure o anel de noivado que acabara de ganhar.
-- Veja este anel, Watfa, não é maravilhoso? Olhe quantos brilhantes! Mas o noivo é ainda mais belo que o anel. Ele é mais lindo que meu irmão.
-- Mais lindo que Omar Sharif? Impossível, não diga essa besteira.
-- Ele é mais lindo, mais culto, e tem uma bondade única. Pena que o vejo pouco, ele lá no Líbano e eu aqui no Egito. Mas quando nos casarmos eu me mudarei para lá.
Quem seria o noivo daquela mulher? Como poderia haver alguém em Beirute que Mireille não conhecesse e que valesse tanto a pena conhecer? Claro que o noivo daquela mulher só poderia estar em Beirute, única cidade do Líbano em que um homem verdadeiramente interessante suportaria viver. E Mireille achava que já conhecia todos...
-- Como se chama o seu noivo?, perguntou a manicure.
-- Ibrahim. Ibrahim Shahim Bacha El Malouf, ou simplesmente Brahim Pachá.
Que horror! Não podia ser verdade! Agora que Mireille conheceu o tal Ibrahim... Será que aquela mulher não tinha o menor senso de ridículo? E ainda por cima usando um título nobre para identificar o noivo caipira?
Se Mireille tivesse prestado mais atenção às histórias contadas por Ibrahim saberia de que nobreza falava a moça. Tratava-se de uma aristocracia conhecida em todo o Oriente Médio, iniciada com Boutros Abu Nijen Malouf, tataravô de Ibrahim. Nascido na cidade de Zahle em 1788, Boutros possuía duas vilas na região, Aas Saeedeh e Beit Maayel, onde seus parentes viviam.
Em 1819, iniciou-se uma grande rivalidade em Zahle entre o clã dos Harfooshi e as demais tribos. O estopim dessa rivalidade ocorreu quando Diyaab Harfooshi matou dois homens das outras tribos em Al Qaataara, local de extração de carvão ao oeste do Líbano. Diyaab foi morto em seguida, por vingança. O príncipe sírio Basheer pediu que a paz fosse restabelecida, mas foi em vão: os Harfooshi trataram de matar os assassinos de Diyaab logo após a tentativa de reconciliação. Indignado com a insubordinação dos Harfooshi, Basheer convocou as demais tribos de Zahle a enfrentá-los.
Em 1824, Boutros Malouf soube que o filho de Diyaab, príncipe Ameen Al Harfooshi, estava em Beit Maayel, terras de sua propriedade, e avisou o príncipe Basheer. O príncipe pediu a Boutros que organizasse uma expedição de captura. Com o tataravô de Ibrahim à frente, as tribos de Zahle marcharam para Beit Maayel. Depois de uma batalha que deixou vítimas de ambos os lados, os Harfooshi foram expulsos da região.
O episódio serviu para que Boutros fortalecesse o vínculo com o príncipe Basheer e, a partir daí, encontrasse portas abertas para diversos negócios que o favoreciam. Tornou-se um importante comerciante das safras locais, especialmente de trigo, e também de cabras e carneiros. A influência de Boutros aumentou ano após ano, até ser designado administrador de Zahle. Sua morte, no dia 5 de outubro de 1843, provocou grande comoção em toda a região.
O filho de Boutros, Namen Boutros Malouf, nascido em 1831, herdou não apenas os traços físicos do pai – era alto e forte –, mas também a reconhecida coragem. Órfão de mãe desde os dois anos e de pai aos 12, Namen passou a cuidar dos irmãos e irmãs e se transformou, ainda adolescente, no administrador dos negócios da família. Foi bem sucedido desde cedo.
Certa vez, ele decidiu viajar para Kloordaajh, perto da Turquia, para comprar um grande número de carneiros e revendê-los no Egito, onde os preços eram maiores. Depois de quatro meses de viagem, voltou ao Líbano com 15.000 carneiros, mas encontrou um cenário caótico: a febre amarela se espalhava rapidamente pela região. Muitos dos pastores que cuidavam dos carneiros adoeceram e parte do rebanho ficou à mercê de ladrões. Restaram apenas 4.000 cabeças.
Namen conseguiu vender os animais que sobreviveram ao Egito, mas o infortúnio continuou: os carneiros adquiriram varicela na viagem até Alexandria, local combinado para a entrega, e tiveram que ser jogados ao mar. Ele ficou sem nada. Recuperou-se aos poucos do baque financeiro importando trigo de Damasco e revendendo-o no Líbano.
Aos 18 anos, Namen fora pai de um menino, Ibrahim, nascido em 1849. Ainda muito jovem, Ibrahim assumiu cargos administrativos em Zahle, mantendo a tradição do avô Boutros. Em 1900, a pedido do governador do Líbano, tornou-se membro da Comissão de Educação e Agricultura. O cargo fez seu prestígio diante da nação turca aumentar a ponto de ser nomeado “Graduado Oficial” do governo turco na região. A maior honra viria em seguida, na forma de um poema presenteado por um dos maiores autores do Oriente Médio, o poeta Dawani Al Qutoof:
Ibrahim Malouf
Alcançastes o maior dos títulos;
Que com ti caminhará e
tua herança será transmitida aos teus herdeiros.
A ti, funcionário louvável,
foi dada uma graça,
por tão fiel dedicação.
Deus o protegerá a ti e aos teus
de quaisquer calamidades
e aflições.
Foi lhe dada
segurança
pelas mãos dirigentes.
Congratulamos Ibrahim
por seu título de
Terceiro Oficial.
Seis anos depois, Ibrahim recebeu o título de “Príncipe dos príncipes”, por meio de um Decreto de Privilégio assinado pelo sultão da Arábia. A notícia teve grande repercussão nos jornais do Líbano, da Síria, do Egito e até da América. Ibrahim tornava-se, assim, o mais ilustre dos filhos de Zahle. Foram três meses de festividades na cidade para celebrar a condecoração. Visitantes chegavam de outras regiões para cumprimentá-lo e centenas de correspondências foram enviadas por filhos de Zahle espalhados pelo mundo.
Ibrahim teve dez filhos. Foi a Shahim que, ao morrer em 1917, Ibrahim deixou o título de pachá, sua espada, a espingarda e um quadro que pertencera aos antepassados. O quadro foi deixado por Shahim ao seu filho, batizado com o mesmo nome do avô, Ibrahim. Esse quadro estava pendurado na entrada da fazenda quando Ibrahim e Mireille foram visitá-la ao lado de Tôni e Sônia.
“Quem liga para esses títulos árabes e antiquados quando existem hoje no mundo empresas gigantescas como a Texaco e dirigentes que adotam lemas como ‘Quero ações e não palavras’”?, pensara Mireille, lembrando do primeiro ex-marido, executivo do setor de petróleo, no exato momento em que Ibrahim mostrava, com grande orgulho, o quadro passado há gerações de pai para filho.
Como em uma alucinação, Mireille começou a imaginar em rápidos flashes a vida infeliz, vazia e monótona que estaria reservada à mulher que se casasse com aquele moreno de olhos negros e bigodinho bobo – ainda mais com tantos loiros de olhos verdes à disposição na Europa... Ah, que saudades de Statis!
***
O noivado de Ibrahim já durava nove anos. Era um típico compromisso de conveniência, acertado entre as duas famílias. Um eventual rompimento àquela altura seria impensável, uma grande desonra. Adibe, sua mãe, ficou seriamente preocupada ao saber que o filho estava se aproximando de alguém com a ficha corrida de Mireille. Para tentar evitar o pior, ela entrou em contato com Ibrahim e ordenou que ele parasse imediatamente com aqueles encontros sem propósito, antes que a fofoca chegasse aos ouvidos das famílias mais tradicionais do Líbano.
Adibe era uma mulher de temperamento forte. Muito bela na juventude, tinha traços marcadamente árabes – morena com expressivos olhos negros. Vestia-se impecavelmente, de forma clássica. Sua marca registrada era o coque sempre perfeito, sem um fio fora do lugar. Tinha fama de arrogante e preconceituosa, mas era inegavelmente culta e carismática.
Nascida em São Paulo, cresceu entre comerciantes e mascates. Era filha da primeira leva de libaneses que chegaram ao Brasil, no final do século XIX. Imigrantes libaneses e sírios eram genericamente registrados pelas autoridades brasileiras como “turcos”, e dessa forma imprecisa passaram a ser chamados no país. Com o tempo, os “turcos” ganharam a fama de pães-duros, influência dos personagens estereotipados que apareciam em programas humorísticos do rádio.
O pai de Adibe, Nicolau, chegou ao Brasil pobre e fez fortuna como comerciante, mas depois perdeu tudo, culpa de um irmão que apostou a fazenda da família na mesa de jogo. Nicolau morreu pouco depois, dizem que de desgosto, deixando os nove filhos – cinco mulheres e quatro homens – em má situação financeira.
Os filhos tiveram que se virar. Mais velha entre as mulheres, Adibe liderava as irmãs no trabalho como chapeleiras, em uma loja estabelecida na avenida São João, centro de São Paulo. As mulheres da alta sociedade paulistana encomendavam a elas os seus chapéus, acessório obrigatório para compor a elegância feminina à época. Foi a forma que Adibe e as irmãs encontraram para assegurar o sustento da família depois da falência e morte do pai.
Envolvida com a tarefa, Adibe se sacrificava pela mãe, irmãos e irmãs, e deixava sua vida pessoal em segundo plano. Ela havia sido apaixonada por um jogador de futebol – goleiro do Santos –, mas considerou que aquele não era o homem ideal para se casar (os jogadores de futebol ainda não ganhavam a fortuna que viriam a receber décadas depois). Quando conheceu Shahim, um fazendeiro riquíssimo e de grande bondade, que acabara de chegar ao Brasil, e que não disfarçava o encanto causado pela beleza de Adibe, julgou ter encontrado o marido ideal.
Depois do casamento, Shahim a levou para o Líbano, onde Adibe logo se sentiu em casa. Quando o pai ainda era rico, ela havia tido um professor particular para ensiná-la a ler e a escrever em árabe. Vivendo no Líbano, passou a dominar o idioma melhor do que muitos libaneses. Começou a escrever poesias, como era tradição na família do marido. Tornou-se uma das poucas mulheres de todo o Oriente Médio capazes de ler, traduzir, escrever e fazer versos em língua árabe.
Adibe e Shahim tiveram dois filhos: Ibrahim, nascido em 1931, e Nouhade, três anos mais jovem. Um casal de irmãos que cresceu em um ambiente familiar formal e severo, estreitamente ligado a influências políticas, porém repleto de livros e de cultura. Ibrahim, mais extrovertido que a irmã, tinha um aguçado senso de humor e gostava de sair em turma, de dançar e de celebrar a vida. Nouhade, parecida com a mãe, preferia o ambiente familiar, seguindo à risca o papel que se esperava das mulheres libanesas à época.
Shahim morreu quando Ibrahim tinha 16 anos. Adibe assumiu os negócios da família e passou a controlar a herança deixada pelo marido. Transformou-se de vez em uma mulher poderosa e autoritária. Planejava encaminhar os filhos para casamentos de conveniência.
Ibrahim formou-se em filosofia e humanidades pela universidade de Saint Joseph, em Beirute, que seguia o currículo de Sorbonne, já que o Líbano estava sob protetorado francês. O rapaz parecia cumprir, página a página, o script reservado a ele. Nouhade, com grande talento para a escrita e uma cultura invejável, também enveredara pelo caminho da filosofia e das letras, mas abandonou os planos para seguir os rumos designados por sua mãe, origem da imensa tristeza que a perseguiria pelo resto da vida.
Sempre obediente à autoridade da mãe, Ibrahim considerou que Mireille representava uma ótima oportunidade para quebrar essa regra. Sem maiores pretensões – a verdade é que não lhe passava pela cabeça romper o noivado –, ele não apenas continuou vendo Mireille como ainda fazia questão de contar a ela como a mãe e os parentes dele em Beirute estavam chocados com os encontros dos dois no Hotel Kadri.
Pela primeira vez desde que conhecera Ibrahim, Mireille ouvia com verdadeiro entusiasmo cada palavra do que ele dizia. Estava satisfeita por abalar as bases de uma família que representava tudo o que ela desprezava, uma família que dava importância excessiva às aparências, às tradições, aos sobrenomes. Sentia-se desafiada, o que a levou a superar de vez a ameaça de depressão. Sem nada a perder, resolveu levar aquele desafio adiante. Seria divertido competir com a célebre e poderosa Adibe Malouf.
-- Vamos ver quem ganhará essa batalha – pensava Mireille, enquanto lançava em direção a Ibrahim o seu típico olhar falsamente desinteressado.
A temida “ficha corrida” de Mireille de fato incluía muitas conquistas passageiras. Aos 17 anos, assim que retornou da Suíça, ela causou frisson em Beirute com a sensualidade que desabrochava aos olhos de todos. Pronta para ser apresentada à sociedade local, passou a acompanhar o pai nos eventos que ele precisava freqüentar como alto funcionário da hierarquia governamental. Zareh orgulhava-se muito da companhia da filha, que havia se transformado não apenas em uma mulher bonita, mas também em uma jovem capaz de conversar sobre qualquer assunto e que já havia visitado os lugares mais exóticos do mundo.
Em uma dessas recepções, na embaixada dos Estados Unidos – um baile em homenagem à companhia de petróleo Aramco –, ela recebeu um “torpedo” de um rapaz que assinava Olen Webb. O bilhete dizia apenas que ele estava encantado com tamanho charme e gostaria de conhecê-la.
A palavra usada por Joe (esse era o apelido do rapaz) para tentar marcar um encontro foi “date”. Como Mireille estava longe de ser fluente em inglês, ela fez uma pequena confusão ao interpretar o bilhete. Foi à mesa dele e o cumprimentou:
-- Muito prazer, senhor Date. Gostei do seu bilhete.
Joe achou que a bela moça estava brincando e ficou ainda mais encantado com Mireille. Ele era um dos diretores da Aramco na Arábia Saudita. Tinha pouco mais de 30 anos, o dobro da idade dela. Os dois começaram a namorar e dois meses depois estavam casados. Passaram um ano na Arábia Saudita, antes de se mudarem para o Texas, onde Mireille foi finalmente apresentada à cultura norte-americana – e, verdade seja dita, não simpatizou com os afazeres domésticos desde o princípio.
No Líbano, a casa do pai de Mireille vivia cheia de empregados. Ela estava acostumada a ter sempre alguém por perto para ter qualquer desejo realizado – bastava estalar os dedos, e às vezes nem isso. De manhã, o café era servido no quarto. Depois do almoço era a hora das compras e do cabeleireiro. À noite, tempo livre para a badalação.
Ao longo do ano que Mireille passou na Arábia Saudita com Joe, a mordomia continuou. Mas nos Estados Unidos tudo mudou: ela se confrontou com o estilo “faça você mesmo”, tão apreciado pelos norte-americanos. E detestou. Achava insuportável o barulho da máquina de lavar roupa, o cheiro do sabão em pó, essas coisas que faziam parte do cotidiano de qualquer dona de casa moderna. Eis mais uma das contradições de Mireille. Era uma mulher ultramoderna, mas apenas para o que lhe parecia conveniente...
Além do mais, havia o tal do happy-hour. Joe sempre bebia seus drinques em casa, depois do expediente, e freqüentemente chamava amigos – a quem gostava de exibir a esposa quase como um bibelô. A conversa não tinha hora para acabar e era comum Mireille se ver obrigada a adentrar a madrugada com cinco ou seis sujeitos meio bêbados dentro de casa.
Até que chegou o dia em que ela decidiu largar aquela vida: simplesmente avisou ao marido que estava voltando ao Líbano, pondo fim a um casamento de sete anos.
De volta a Beirute, reencontrou a vida que adorava: muitas festas, night clubs, nenhum compromisso ou afazer doméstico. Freqüentava a Byblos, uma boate tão famosa que mais tarde abriria uma filial em Saint Tropez. De manhã, ia à piscina do Hotel Phoenicia tomar sol. À tarde, passeios ou chá com as amigas. À noite, retomou o hábito de acompanhar o pai nas recepções. Durante as férias de verão, Mireille ficava nas praias de Beirute, enquanto no inverno ia esquiar nas montanhas – tornando-se, agora sim, uma esquiadora hábil.
Nessa fase, Mireille ganhou uma nova companhia para as badalações: a própria mãe, Marie. Apreciar a noite talvez tenha sido uma herança genética. A vocação mundana de Marie foi um fator decisivo para que o casamento com Zareh chegasse ao fim. Os dois se separaram quando Mireille era criança. Mesmo separados, no entanto, Zareh e Marie continuavam bons amigos. No final da vida, inclusive, voltariam a viver juntos.
Marie gostava de jogar bridge, de fumar e de beber, comportamento também muito avançado para a época. Ela passou a chegar cada vez mais tarde em casa e a perder mais e mais dinheiro na mesa de jogo, vício que herdara do pai, jogador compulsivo. Sempre que chegava sem uma jóia, argumentava ao marido que a havia perdido em algum lugar – jamais admitia o vício do jogo. Um dia, quando disse ter perdido um par de brincos, a reação do marido não foi passiva como costumava ser.
-- Você me acha bobo? Dois brincos não podem cair ao mesmo tempo das orelhas..., ironizou Zareh. – Como já faz algum tempo que você não tem se comportado de forma adequada, vou a partir de agora morar na minha casa e você na sua. Eu cuido da nossa filha e você do nosso filho. Não a deixarei desamparada, mas espero que você contenha sua loucura. Se tudo der certo, poderemos ser bons amigos.
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